quinta-feira, 31 de maio de 2012

flor do asfalto

o medo bloqueava. o medo não existe mais. o meu deu lugar a um espaço vazio, pronto para ser preenchido pelo todo. e o todo vem, vem pulsante, vem arrebatando meu peito, o nosso peito, a nossa mão dada, o todo envolve nosso ser, o todo é parte de tudo, o todo está em mim, está em você.
o medo deu lugar ao todo. o medo foi importante sim. o medo fez crescer, fez sentir um todo mais consciente. mas o medo não deve ficar. a destruição vem para tudo renascer. o não vem para o sim. o caos, o vazio antigo, a morte, a morte. morte do velho, nasço o novo em mim. nasça, floresça nisso tudo aqui em volta do meu ser, cresça ramos floridos entre meus dedos dos pés. os ramos me envolvem, sinto afago da terra.
antes o que era terra morta, terra morta foi adubo da flor que nasce.
não tem nada que segure a flor no asfalto, ela rompe como disse carlos, ela rompe a pedra dura do ódio e do pesado passado, a flor rompe, dilacera a mágoa em pedaços ínfimos de nada, o nada se torna vento, voa.
flor de chão, amarre-se aos meus pés, envolva-os. quero levá-la comigo e além.

sábado, 26 de maio de 2012

Santa Cruz


nada se compara. nada se compara a ir para casa. e a casa é onde meus hábitos tem habitat. nada se compara a corações que se afagam. na-da.
nada preenche mais que o calor de um coração no outro. vem do estômago e sai pelo centro do peito esse aperto que não dói. aperto de amor.
é um foco de luz que irradia, o aperto é a sua força de sair. se espremer entre as costelas, um pouco dividido pelo esterno.
sai aos trancos, o amor.
sai por dentro, o amor.
sai pelas narinas, por entre os dedos, escapa, se esvai, se perde, se ganha tanto, tenta em vão se prender no centro da mão, só pelo fato de sentí-lo mais um pouco em seu corpo.
não fica. o amor sai como o ar já gasto precisa sair de mim e tomar conta do ambiente, voar, volar, volar.
e tocar, leve, nas superfícies ao redor. repousar.

domingo, 20 de maio de 2012

como jogar uma taça delicada no chão

o som é doloroso.
o vidro encosta no chão, o atrito, o contato, a força do vidro no chão, a força do chão no vidro. é terrível! quebra os ossos. dói na espinha vê-lo assim, no chão. esse vidro tão resguardado no armário, na vitrine da sala. esse vidro que segurava com panos, com luvas de algodão pra que não, não se despedaçasse, nem fosse riscado. o pano no vidro, o pano era grosso, não via, mas ele estava sendo riscado. dói o atrito do pano na superfície lisa. não era tão lisa mais, segurá-lo tantas vezes o fez menos delicado.
um dia olhei essa taça mais uma vez, rotina limpá-la, lustrá-la com aquele tal pano.
o atrito tinha feito tantos vincos já naquela superfície. o cuidado já magoava. a proteção estilhaça meu peito. a proteção aperta meu coração. meu órgão já não consegue bater de se ver preso por estas mãos. apertado por estes dedos cobertos de pano.
depois dessa dor, jogo. solto no ar um copo de anos. um corpo de anos. solto no ar, ele paira anos em minha mente. de fato, foram segundos. abro as palpebras já não é o mesmo.
partículas por todos os lados, pedaços deste objeto no chão. não vejo mais o que ele era. agora são cacos. tento calcular, tento reformular na minha mente o que eram esses corpos, pequenos corpos. impossível ver. IMPOSSÍVEL. como uma venda no meu olhar, o chão quebrou aquilo e já não me lembrei o que era que estava na minha mão, que mão? o que era aquilo?
vazio no peito,
tento reler para relembrar. quase impossível saber o que era.
só sei dizer até aí. o copo se quebrou, os cacos no chão.
não, acho que lembro o que fiz depois. na verdade estou aqui, juntando-os. tinha me esquecido. lapsos mentais.
me esqueço de novo e de novo, como começar a explicar o que fiz quando comecei a juntar estes corpos que estavam espalhados? 
é preciso muita força para lembrar, mas foi assim:
peguei um por um estes cacos. é, são cacos. não são corpos. agora os considero assim. olhei um por um: são grossos. têm uma largura. pareciam tão finos quando era uma taça. taça fina. agora olho-os de verdade. parece que vejo os vincos do sólido amorfo. as ondas da fluidez que ele possue. e QUE NINGUÉM VÊ. ninguém vê a fluidez do vidro. porque? PORQUEEEEEEEEEEEEEEEEEEE?
QUERO GRITAR PRA QUE VEJAM! HÁ FLUIDEZ NO VIDRO! PORRA! VEJAM.
os cacos fluidos e sólidos ao mesmo tempo em minha mão. não doíam porque os segurava de um jeito confortável. duas mãos postas uma do lado da outra, em concha.
agora jogo-os na mesa. na superfície dura  e segura da mesa. meu espaço rígido onde posso trabalhar com meus pedaços, de taça.
aqui estão vocês.